30 de dezembro de 2009

Metalinguajar

O bonde passa cheio de pernas,
pernas brancas pretas amarelas.
Passa o meu tempo, contratempo,
pois desdigo o que penso
já que não posso mais falar.
A veia do poeta é turva
e os cabelos ralos
(cobrindo olhos cansados).
Sua caneta defeca bolinhos de tinta
que já não dizem nada,
mas outrora disseram
o que ninguém mais expressaria.
Pegue, doutor, esta tesoura,
e corte minha singularíssima pessoa.
Aqui jaz o eu-lírico
estirado sobre o papel,
que a tinta suja, afaga e refresca.
Sangue, por que não?
posto que há sentimento,
talvez um monte de nada
que preenche umas linhas.
Se é para isso que serve o poeta,
eu te digo, poesia:
de tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo
e sempre
e tanto.
Se insiste em morrer
eu também me morro em palavras:
mas que seja infinito enquanto dure.

27 de dezembro de 2009

Parangolé

Na dança gira feito roda
Rodam pés, cabeças tortas.
Braços de vento, rodopios,
gira-girou vestido.
Anil desbotado, flor no cabelo,
braços de vento, pés em roda.
E a dança consome o chão,
Consome o pé, o pó da terra,
terra que gira,
roda,
gira-girou.
Dança dos braços e abraços,
dos quase movimentos
longilíneos, entrelaçados.
E dança
E roda
E rodopia
Aproveita toda essa gira
que se mantinha viva
e num gira-girar
parou.